8.17.2001

Nesta sexta-feira, a minha editora vetou a matéria que estava fazendo sobre animadores. Infelizmente ela não achou noticioso. Eu achei, inclusivo entendi que o assunto é bastante interessante. Enfim, gostei pra caramba de escrevê-la, produzi-la, por isso vou publicá-la aqui.
Computador difundi animação e tira brilho de desenho à mão
Por Tiago Pariz
SÃO PAULO - A tarefa desenhar e toda produção de arte final e animação está muito mais fácil com a tecnologia possibilitada pelo computador, porém essa acessibilidade tem seus problemas: o desenho mais chapado e a massificação da animação
A máquina está tão difundida que não somente novos artistas utilizam-na, desenhistas consagrados como o cartunista Laerte estão comprometidos até o pescoço com a máquina. Basicamente, ele usa as ferramentas na arte final de sua produção, ou seja, pintar e "esculpir o traço".
O cartunista aponta como a principal eficácia do computador a velocidade que imprimiu à sua produção, mas admite que por isso seus desenhos perderam um pouco de qualidade.
Laerte afirma que não tem muito tempo de detalhamento por causa da quantidade de produção."O ritmo de trabalho acaba sendo contrário ao cuidado, consequentemente empobreceu meu traço", disse, mas fez uma ressalva: "Não que meus trabalhos sejam ruins, mas se pudesse criar menos, eles seriam mais minuciosos".
Para Laerte, existe na produção pelo computador um paradoxo: utilizando as ferramentas de pintura, luz e dégradé cria-se um vício conservador no traço, pois o desenhista envolve-se em armadilhas de criatividade como a restrição de técnicas de desenho.
Mas não é somente no desenho estático que o computador está contribuindo. Ele aparece ainda mais forte no uso de animação para Internet.

A ANIMAÇÃO PARA WEB E SEUS PESARES

O ilustrador Daniel Santiago explica que a difusão do computador deve-se essencialmente à facilidade do uso dos programas.
"Qualquer um com um computador básico pode fazer seu desenhinho e dar a cara para bater. Não precisa de muito dinheiro tampouco experiência", disse.
"Para ser um animador não há muita dificuldade, precisa apenas de muita paciência e domínio dos programas", afirma o ilustrador e animador Rodrigo Manfredi.
O animador da Produtora Aqueles Caras, Bernardo Prata, resume isso "na possibilidade de criar sozinho, aprender a usar o software e com um orçamento quase nulo ter um desenho animado".
O que ele quis dizer é que não é mais necessário ir à uma ilha de edição, gastar com filmes, fotolitos e material de desenho, ou seja, uma pessoa em casa com um pequeno conhecimento de Flash pode transformar uns rabiscos em animação.
Foi assim que ele e seu colega Julian Coate produziram a animação "Popozão" para o Animamundi 2001 e ficaram em segundo lugar na categoria melhor vídeo brasileiro.
Coate acredita que é nesta facilidade que surge o problema: a massificação das animações. "Por mais ferramentas que programas como o Flash tenham, elas não ensinam noções de animação, como luz, contraste, profundidade. Com isso, o trabalho fica pobre muito mais pobre", disse.
Santiago acredita que para não cair nesse marasmo é necessário a presença de uma pessoa com o conhecimento de desenho no trabalho. "A inovação está na presença de ilustradores que aumentam a qualidade dos desenhos e animações. Tornando-os cada vez mais parecidas com desenhos animados", afirma.
Coate concorda com Santiago e vai um pouco mais além, pois entende que ao computador falta a ferramenta "criar criatividade". Forma que para ele somente um pincel e uma caneta podem moldar.
Ele exemplifica com o desenho "O Velho e o Mar", de Alexander Petrov, vencedor do último Oscar como melhor animação. "Ele utilizou de uma técnica onde cada quadro é uma pintura feita com dedo e pincéis usando uma tinta siliconada sobre vidro", disse. "O computador por si só nunca será capaz de criar algo desse porte", acrescentou.
Dessa forma a máquina acaba criando um paradoxo em si mesmo, pois ao mesmo tempo que difundi, massifica e limita a criatividade. Ainda assim, existe o lado positivo dessa explosão de animadores: "É que eles não têm o vício do mercado, então, aparecem produções mais alternativas e completamente experimentais", afirma Coate.
A tarefa de desenhar pode estar muito mais fácil com as ferramentas possibilitadas pelo computador, mas a vivacidade criada com o papel e a caneta, como diz Prata, "nunca ficará obsoleta".

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