5.08.2004

Lendo Manuel Bandeira sob chuva

Cena Um:

Júlia: Estou com saudades.
Pedro: Por que? Estou aqui do seu lado.
Júlia: Porque sim. Acho que temos um problema!
Pedro: Claro! Você está com saudades ao meu lado.
... ...
Pedro: Vai ficar calada?
Júlia: Será que a gente está fazendo a coisa certa?
Pedro: Olha, eu fiz uma música para você. Chama-se "Distante".
Júlia: Tá vendo só... até você percebeu que há algo estranho. Não acha esquisito eu virar do nada e falar que estou com saudades (Pedro tenta interromper). Não, me ouça. A intimidade não é mais suficiente. Eu me pergunto se estamos fazendo a coisa certa porque em alguns momentos eu não consigo vislumbrar futuro entre nós. Estou aqui do seu lado e desde que eu cheguei você não olhou nos meus olhos (Tenta mais uma interrupção). Preste atenção, é importante. Parece que você está com medo de alguma coisa. Eu sei que essa história de compromisso contigo sempre foi foda, mas aparentemente você está mudando.
Pedro: Estou mesmo.
Júlia: Às vezes parece que você progrediu, mas na maioria das vezes você está distante, concentrado em qualquer coisa menos em mim. Você não acha estranho ter 24 anos e só um namoro ter durado mais de 2 meses?
Pedro: Você está ignorando o fato de eu ter feito uma música para você, o que é algo super romântico. Eu não conheço muitos casais que o cara faz uma música para sua mina sem ser dia dos namorados, aniversário, reveillon, natal ou rosh hashanah. E o título da música não importa....
Júlia (interrompendo): Eu não quero saber da bosta de uma estúpida música, eu quero que você preste atenção em mim. Você nem prestou atenção na pergunta que te fiz. Larga essa merda de violão. Eu estou falando uma coisa muito séria. Você consegue ver futuro entre nós?
Pedro: Primeira resposta: Não acho. Segunda reposta: Se ao menos você ouvisse a música que fiz, você entenderia. Olha, eu não canto, só vou ler a letra. Pode ser?
Júlia: Qual futuro?
Pedro: Esse futuro distante/Que nos aproxima cada vez mais/Um sussurro calado/A absolvição de estar ao seu lado. Esse futuro distante/Que acalenta e dá calafrios/E reconforta, e alivia, e suaviza, e consola, e anima. Nesse futuro distante/Eu queria repor/Se soubesse repor/Em seu coração/As mais puras alegrias de tua infância!
... ...
Pedro: Gostou? Quer dizer, o finalzinho é uma adaptação de uma poesia do Manuel Bandeira, o resto fui eu quem escreveu. Será que você entende?
Júlia: Aparentemente, não.
Fim da cena um.